Contexto Clínico
A ruptura do tendão de Aquiles é uma lesão encontrada com bastante frequência, com uma incidência de 31 por 100 mil por ano,e é mais comum na população ativa de jovens a meia-idade, com idade média de 37 a 44 anos. Estudos recentes indicam que a incidência de ruptura do tendão de Aquiles continua aumentando devido a uma população mais ativa. A lesão do tendão de Aquiles pode ser debilitante devido ao seu papel na deambulação e atividade, afetando atletas e não atletas. O manejo das rupturas agudas do tendão de Aquiles ? tratamento cirúrgico ou conservador ? é bastante debatido.
Várias metanálises de ensaios clínicos randomizados (ECRs) demonstraram que o tratamento cirúrgico reduz bastante o risco de rerruptura do tendão em comparação com o tratamento não operatório, porém levando a um aumento significativo de outras complicações, como infecção, trombose venosa profunda e lesão do nervo sural. A discordância encontrada na literatura indica que novas investigações são necessárias, uma vez que os protocolos de reabilitação, as restrições ao suporte de peso e as modalidades de tratamento evoluíram.
O Estudo
O objetivo primário dessa revisão sistemática e dessa metanálise foi comparar a taxa de rerruptura, taxa de complicações e resultado funcional após o tratamento cirúrgico versus tratamento conservador para rupturas agudas do tendão de Aquiles. Foram selecionados ensaios clínicos randomizados e estudos observacionais relatando a comparação do tratamento operatório versus não operatório de rupturas agudas do tendão de Aquiles.
Do total triado, 29 estudos foram incluídos ? 10 ensaios clínicos randomizados e 19 estudos observacionais. Os 10 ensaios clínicos incluíram 944 (6%) pacientes, e os 19 estudos observacionais, 14.918 (94%) pacientes. Uma redução significativa nas rerrupturas foi observada após o tratamento operatório (2,3%) comparada com o tratamento não operatório (3,9%) ?diferença de risco, 1,6%; razão de risco, 0,43; IC 95%, 0,31 a 0,60; P <0,001; I2 = 22%. O tratamento cirúrgico resultou em uma taxa de complicações bem maior do que o tratamento não cirúrgico (4,9% versus 1,6%; diferença de risco, 3,3%; razão de risco, 2,76; IC 95%, 1,84 a 4,13; P <0,001; I2 = 45%).
A principal diferença na taxa de complicações foi atribuída à incidência de infecção (2,8%) no grupo operativo. Uma redução semelhante na taxa de rerruptura em favor do tratamento cirúrgico foi observada após o peso total precoce e tardio. Não houve diferença significativa na taxa de rerruptura entre o tratamento operatório e o não operatório em estudos que utilizaram reabilitação funcional acelerada com amplitude de movimento precoce (razão de risco, 0,60; IC 95%, 0,26 a 1,37; P = 0,23; I2 = 0%). Nenhuma diferença nas estimativas de efeito foi observada entre ensaios clínicos randomizados e estudos observacionais.
Aplicação Prática
Esta metanálise demonstra que o tratamento cirúrgico das rupturas do tendão deAquiles reduz o risco de rerruptura em comparação com o tratamento conservador. No entanto, as taxas de rerruptura são baixas e as diferenças entre os grupos de tratamento são pequenas (diferença de risco, 1,6%). Por outro lado, o tratamento cirúrgico resulta em maior risco de outras complicações (diferença de risco, 3,3%), o que é atribuível principalmente ao aumento do risco de infecção. Sendo assim, a decisão final sobre o manejo das rupturas agudas do tendão de Aquiles deve ser baseada em fatores específicos do paciente e tomada de decisão compartilhada, pesando riscos e benefícios.
Autor
Lucas Santos Zambon – Doutorado pela Disciplina de Emergências Clínicas Faculdade de Medicina da USP; Médico e Especialista em Clínica Médica pelo HC-FMUSP; Diretor Científico do Instituto Brasileiro para Segurança do Paciente (IBSP); Membro da Academia Brasileira de Medicina Hospitalar (ABMH); Assessor da Diretoria Médica do Hospital Samaritano de São Paulo.
Bibliografia
1.Ochen Y et al. Operative treatment versus nonoperative treatment of Achilles tendon ruptures: systematic review and meta-analysis. BMJ 2019;364:k5120
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